Monday, October 30, 2006
Proper Introduction.
Júlia saía da Fnac com os dentes à mostra. Como que incrédula, sacou, orgulhosamente, do novo album de Pearl Jam de dentro do saco. Absorvida, reparou em todos os pormenores do precioso quadrado.
Fotografia: Rua de Santa Catarina [18.03]. Magotes de pessoas na escuridão. Ouvem-se surdas músicas de Natal. Odeio arroz-doce. Há pais e mães com embrulhos. Uma menina tenta apertar os ténis. No meio do reboliço populacional desorganizado, já caiu duas vezes, mas ela sabe e vai aperta-los. Nada me demove. Há luzinhas incoerentes.
Continuei a descer a rua. Inspeccionava, agora, a contra-capa. Ainda bem que não chove. Gosto de Natal frio e sem chuva.Tenho as mãos roxas. É incrível como ainda se fazem compras... Vai ser o primeiro Natal sozinha. Não achava isso triste, apenas diferente. De repente... Tu.
- Ai! Desculpe, desculpe.. - Sustive a respiração. Que tonta, não vejo por onde ando!
- Que tonta, não vês por onde andas?! - Riu-se.
Júlia não achou muita piada. Ficou séria, mas respondeu. Má-educação não é coisa boa.
- Peço imensa desculpa. Vinha colada no CD... Foi um acidente.
- Acidente oportuno, vês! Andava exactamente à tua procura. - Estende-lhe a mão com um pacote que recuperou do saco a tira-colo, uma prenda. Júlia paralisa. - Vamos, pega! É para ti. - Insistiu.
Ela recebeu o pacote suspeito. Olhou-o desconfiada. Olhei para ti, olhei o embrulho, olhei-te novamente...
- Vejo que falar não é bem das tuas actividades preferidas. - Piedade zero do meu angustiante embaraço.
- Depende do tópico. Aliás, depende de muitas coisas. Obrigada pela prenda. - Pensamento branco.
- De nada.- Seco. Olhou o relógio no pulso direito.- Wow, very late, I am!- Só lhe vi o casaco comprido a esvoaçar na retaguarda. Quem és tu?
Júlia estancou. Acho que sei decor todos os paralelos destes dois metros quadrados de chão, mas não te sei a cara. Bem... Não deveria concerteza ser importante. Curioso, interessante, mas, de todo, importante. Reparou no pacote. Tinha congelado a mão como se a prenda fosse parte integrante do corpo. Abriu-o rapidamente. Rasgou-lhe o papel branco e dourado. Umas luvas e uma nota num pedaço de papel pautado.
" Tens as mãos gretadas. Está frio. "
Fotografia: Rua de Santa Catarina [18.03]. Magotes de pessoas na escuridão. Ouvem-se surdas músicas de Natal. Odeio arroz-doce. Há pais e mães com embrulhos. Uma menina tenta apertar os ténis. No meio do reboliço populacional desorganizado, já caiu duas vezes, mas ela sabe e vai aperta-los. Nada me demove. Há luzinhas incoerentes.
Continuei a descer a rua. Inspeccionava, agora, a contra-capa. Ainda bem que não chove. Gosto de Natal frio e sem chuva.Tenho as mãos roxas. É incrível como ainda se fazem compras... Vai ser o primeiro Natal sozinha. Não achava isso triste, apenas diferente. De repente... Tu.
- Ai! Desculpe, desculpe.. - Sustive a respiração. Que tonta, não vejo por onde ando!
- Que tonta, não vês por onde andas?! - Riu-se.
Júlia não achou muita piada. Ficou séria, mas respondeu. Má-educação não é coisa boa.
- Peço imensa desculpa. Vinha colada no CD... Foi um acidente.
- Acidente oportuno, vês! Andava exactamente à tua procura. - Estende-lhe a mão com um pacote que recuperou do saco a tira-colo, uma prenda. Júlia paralisa. - Vamos, pega! É para ti. - Insistiu.
Ela recebeu o pacote suspeito. Olhou-o desconfiada. Olhei para ti, olhei o embrulho, olhei-te novamente...
- Vejo que falar não é bem das tuas actividades preferidas. - Piedade zero do meu angustiante embaraço.
- Depende do tópico. Aliás, depende de muitas coisas. Obrigada pela prenda. - Pensamento branco.
- De nada.- Seco. Olhou o relógio no pulso direito.- Wow, very late, I am!- Só lhe vi o casaco comprido a esvoaçar na retaguarda. Quem és tu?
Júlia estancou. Acho que sei decor todos os paralelos destes dois metros quadrados de chão, mas não te sei a cara. Bem... Não deveria concerteza ser importante. Curioso, interessante, mas, de todo, importante. Reparou no pacote. Tinha congelado a mão como se a prenda fosse parte integrante do corpo. Abriu-o rapidamente. Rasgou-lhe o papel branco e dourado. Umas luvas e uma nota num pedaço de papel pautado.
" Tens as mãos gretadas. Está frio. "
Tuesday, October 10, 2006
Sofia.
O que é, para mim, a Filosofia?
Um debate, irremediavelmente inconclusivo, porém deliciosamente estimulante? Uma conversa em nós, ou quiçá, um monólogo com o tudo por ruidosa plateia?
Fotografia: o mestre fala sentado numa sábia cadeira. Gesticula. Tem, invariavelmente, uma pilha de pergaminhos e livros cansados, aos quais, raramente, recorre. Não vês, Sofia, que é absolutamente necessário que Saibas?! Ela observa-o admirada. Ah, é esse espanto! É necessário que saiba que não sei?! É imperativo saber da não sabedoria?! Estou confusa e cada vez mais embriegada. Como? Perguntou ela, perguntei eu. Sorriso de satisfação, um ajuste dos óculos insolentes que teimam em escorregar. Desenhei um tímido ponto de interrogação naquela folha branca de expectativa. Rodei-a. Um outro ponto de interrogação, agora firme e robusto, surge como resposta. Sofia olha-o apreensiva. Arriscou e desenhou outro. É isto afinal? O mestre sorri...
Um debate, irremediavelmente inconclusivo, porém deliciosamente estimulante? Uma conversa em nós, ou quiçá, um monólogo com o tudo por ruidosa plateia?
Fotografia: o mestre fala sentado numa sábia cadeira. Gesticula. Tem, invariavelmente, uma pilha de pergaminhos e livros cansados, aos quais, raramente, recorre. Não vês, Sofia, que é absolutamente necessário que Saibas?! Ela observa-o admirada. Ah, é esse espanto! É necessário que saiba que não sei?! É imperativo saber da não sabedoria?! Estou confusa e cada vez mais embriegada. Como? Perguntou ela, perguntei eu. Sorriso de satisfação, um ajuste dos óculos insolentes que teimam em escorregar. Desenhei um tímido ponto de interrogação naquela folha branca de expectativa. Rodei-a. Um outro ponto de interrogação, agora firme e robusto, surge como resposta. Sofia olha-o apreensiva. Arriscou e desenhou outro. É isto afinal? O mestre sorri...
Monday, October 09, 2006
Estirador.
Três meses de Inverno, três meses de frio. Aproximadamente noventa noites de cacau, chá quente e lareira. Há na nossa sala tanto de nós.
Fotografias: saltam do baú desarrumadas. Eles a preto e branco, tu, a sépia, linda, cores de sempre, perdidas. Foste tu que complicaste as almofadas, concerteza. Baralhaste-as todas. Atiraste algumas ao chão. Acendeste a lareira só pelo capricho. Agora estendes-te ao comprido na chaise long vermelha e rois uma maça entediada. Ficas sempre assim quando tenho muito trabalho. As poltronas do xadrez ja te viram, hoje, mais do que uma vez, brincar com as pecitas de marfim encardido. Estás insuportavelmente, deliciosamente mimada. Finjo-me compenetrado só para te ter ainda mais desconcertada. Tu sentes. Levantas-te, aproximas-te dois passos, arriscas duas notas passageiras no piano, calcas as teclas com os dedos, mas eu não olho. De repente Piazzola, dás duas piruetas de tango e pegas no xaile que estava nas costas do sofá maior. És agora a melhor bailarina do mundo e ris. Eu vejo-Te. Confesso que nunca a minha camisa nos ficou tão bem.
É tudo tão nosso. Noites quentes-frias daquele sempre nosso Inverno.
Fotografias: vou rasgá-las todas. Apetece-me. Vou deixar aquela que colocaste em cima da lareira, estou bonita. Roubei a tua camisa, fica-me bem. Tu tentas não olhar. Quanto tempo mais aguentarás? Os teus olhos devem estar baços, cegos e brancos, as tuas costas, doridas. Vou trepar por esses riscos e traços até chegar junto à ponta do teu nariz. Vou partir esses óculos que insistes em empurrar periodicamente com o indicador direito ! Vou-me sentar em cima dessa mesa de medos, em cima desses simbolos de papel, até os perderes. Faço caretas. Das-me um beijo? Vou colar chiclet debaixo desta mesa alta e risca-la com marcadores... Ufa.. Anda dançar comigo! De vez em quando, noto-te um olho curioso, que espreita. Pronto, parti as tuas canecas uma por uma no chão, e agora? Gritas comigo. Não gosto quando fazes isso. Vou lá para fora apanhar chuva doente. Vou cronometrar os teus 5 minutos de falso orgulho, até já.
Aquela chavena de cha mudou-nos para sempre, não foi? .... Não creio.
Fotografias: saltam do baú desarrumadas. Eles a preto e branco, tu, a sépia, linda, cores de sempre, perdidas. Foste tu que complicaste as almofadas, concerteza. Baralhaste-as todas. Atiraste algumas ao chão. Acendeste a lareira só pelo capricho. Agora estendes-te ao comprido na chaise long vermelha e rois uma maça entediada. Ficas sempre assim quando tenho muito trabalho. As poltronas do xadrez ja te viram, hoje, mais do que uma vez, brincar com as pecitas de marfim encardido. Estás insuportavelmente, deliciosamente mimada. Finjo-me compenetrado só para te ter ainda mais desconcertada. Tu sentes. Levantas-te, aproximas-te dois passos, arriscas duas notas passageiras no piano, calcas as teclas com os dedos, mas eu não olho. De repente Piazzola, dás duas piruetas de tango e pegas no xaile que estava nas costas do sofá maior. És agora a melhor bailarina do mundo e ris. Eu vejo-Te. Confesso que nunca a minha camisa nos ficou tão bem.
É tudo tão nosso. Noites quentes-frias daquele sempre nosso Inverno.
Fotografias: vou rasgá-las todas. Apetece-me. Vou deixar aquela que colocaste em cima da lareira, estou bonita. Roubei a tua camisa, fica-me bem. Tu tentas não olhar. Quanto tempo mais aguentarás? Os teus olhos devem estar baços, cegos e brancos, as tuas costas, doridas. Vou trepar por esses riscos e traços até chegar junto à ponta do teu nariz. Vou partir esses óculos que insistes em empurrar periodicamente com o indicador direito ! Vou-me sentar em cima dessa mesa de medos, em cima desses simbolos de papel, até os perderes. Faço caretas. Das-me um beijo? Vou colar chiclet debaixo desta mesa alta e risca-la com marcadores... Ufa.. Anda dançar comigo! De vez em quando, noto-te um olho curioso, que espreita. Pronto, parti as tuas canecas uma por uma no chão, e agora? Gritas comigo. Não gosto quando fazes isso. Vou lá para fora apanhar chuva doente. Vou cronometrar os teus 5 minutos de falso orgulho, até já.
Aquela chavena de cha mudou-nos para sempre, não foi? .... Não creio.